A recente decisão do CNJ representa um marco significativo na organização do sistema de justiça no Brasil. Ao declarar que tribunais estaduais e federais não podem criar normas próprias que deleguem a cartórios extrajudiciais a prática de citações, intimações e notificações processuais, o conselho reafirma que tais atribuições são privativas dos oficiais de justiça. Esse entendimento reforça a centralidade da competência federal para regulamentar o direito processual, garantindo uniformidade e segurança jurídica em todo o território nacional. A uniformidade normativa evita divergências regionais e potenciais abusos administrativos, assegurando que os atos de comunicação processual sejam realizados conforme previsto no ordenamento jurídico.
Para além do aspecto técnico‑jurídico, a decisão reflete preocupação com a regularidade processual e com a proteção dos direitos fundamentais das partes envolvidas. Ao impedir a delegação para cartórios extrajudiciais via normas estaduais ou atos administrativos locais, o CNJ evita que mudanças arbitrárias comprometam a validade de intimações e citações. A medida protege a parte contrária de surpresas processuais injustas, e fortalece a transparência e confiabilidade do sistema judicial como um todo. Isso reforça a função essencial dos oficiais de justiça, cuja atuação já está prevista nas normas gerais do processo civil e penal.
Outro ponto relevante é a preservação da competência legislativa da União para disciplinar matéria de direito processual. Conforme a decisão, permitir que estados ou tribunais editem normas sobre comunicação processual seria usurpar a competência atribuída pela Constituição. A centralização normativa evita fragmentações e discrepâncias entre os estados, promovendo igualdade de tratamento e padronização de procedimentos. Essa uniformidade normativa facilita também o controle de legalidade e a atuação do sistema de justiça como instituição nacional.
Embora o CNJ tenha proibido novas normas estaduais que autorizem a delegação para cartórios extrajudiciais, a decisão não invalida diretamente as leis estaduais já em vigor. Isso significa que, em estados onde tal delegação foi prevista por lei, a situação permanece passível de desdobramentos judiciais. No caso do estado alvo da ação, há ação de inconstitucionalidade em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), o que coloca sob risco a validade dos atos processuais realizados com base nessa legislação. A incerteza gera preocupação entre advogados e partes envolvidas sobre a segurança dos processos que utilizaram esse modelo.
O eventual entendimento do STF pela inconstitucionalidade dessas leis estaduais poderá gerar consequências em massa. Há o risco real de nulidade de milhares de processos em que houve citação ou intimação por cartórios extrajudiciais, o que representaria grave impacto sobre a eficácia e a celeridade da justiça. Essa instabilidade atinge não apenas as partes processuais, mas toda a confiança institucional no sistema judiciário. Por isso, a decisão do CNJ também serve como alerta para a comunidade jurídica e para jurisdicionados sobre os riscos de normas isoladas e descentralizadas.
Sob a ótica institucional, a decisão reafirma os limites da autonomia dos tribunais estaduais e federais quanto à criação de normas administrativas relacionadas ao conteúdo do processo judicial. A Justiça, neste momento, demonstra que não cabe a poderes infralegais buscar caminhos alternativos para flexibilizar a execução de atos processuais sem previsão legal. Essa postura preserva o princípio da legalidade e protege a estrutura normativa básica do Estado de Direito.
Além disso, a decisão contribui para reforçar a legitimidade dos atos praticados dentro dos padrões legalmente definidos. Ao assegurar que apenas oficiais de justiça — previstos no ordenamento — podem realizar citações e intimações, o CNJ protege o devido processo legal e o amplo direito de defesa. Esse cuidado institucional é fundamental para garantir que cada ato processual tenha validade e possa resistir a questionamentos posteriores.
Por fim, é importante que advogados, partes e jurisdicionados acompanhem os desdobramentos dessa controvérsia legislativa e processual. A eventual declaração de inconstitucionalidade das leis estaduais que autorizam a delegação a cartórios extrajudiciais poderá exigir reavaliação de inúmeros processos e readequação de práticas jurídicas. A decisão do CNJ já sinaliza a direção institucional: o Brasil deve manter coerência normativa e respeito às normas federais de processo. Com isso, reforça‑se a importância da observância estrita das regras definidas para comunicação processual no país.
Autor: Anton Gusev

